Porque o aborto intencional é assassinato intrauterino de uma pessoa.

Um dos argumentos basais das pessoas que defendem o aborto é que a pessoa grávida que pretende abortar (que aqui não será chamada de mãe, já que a palavra mãe é muito forte, profunda e pressupõe amor pela vida gerada em seu útero) tem direito de decidir o que acontece com o próprio corpo.

Feto Humano

O argumento, em princípio, é totalmente correto. Todas as pessoas têm o direito de decidir o que fazer consigo mesmas. Nós realmente temos o direito de escolher se queremos fazer uma ou trezentas tatuagens, se queremos ou não furar o nariz para colocar uma argola, e até se queremos ou não ser submetidos a um determinado tipo de terapia ou intervenção médica, como a transfusão de sangue, por exemplo, que não é aceita por determinadas culturas.

E quanto ao aborto? Será que esse nosso direito de escolha pode ser estendido a outro ser humano que está se formando no útero?

De acordo com os defensores do aborto, sim. Segundo eles, a mulher deve ter o direito de decidir se quer ou não continuar a gravidez (geração de vida humana) sem que o ato do aborto (interrupção da vida humana em formação) seja considerado um crime. Pode até parecer estranho, mas o argumento abortista repousa na ideia de que o embrião, o feto e mesmo a criança totalmente formada com nove meses de gestação ainda não podem ser considerados seres humanos. A incompetência jurídica em reconhecer os direitos do ser humano em formação contribui para essa ideia.

Mas o argumento vai além. Ele também pressupõe que o embrião e o feto são apenas tecido (carne) que pertence à mulher. É bastante comum ver defensores do aborto alegarem que o embrião e o feto ainda não são humanos e, como tal, podem ser descartados de acordo com a conveniência das pessoas que pretendem abortar.

É justamente a respeito deste argumento que podemos fazer algumas considerações filosóficas e científicas. Temos uma pergunta a ser respondida: o embrião/feto é uma parte do corpo da mulher ou é um indivíduo humano em desenvolvimento? (peço que desculpem o pleonasmo, afinal todo indivíduo humano está em desenvolvimento constante, não importando a idade, porque seus órgãos, seu metabolismo, suas células estão em constante adaptação ao meio.)

A resposta pode ser encontrada na Ciência. E sua consequência é clara, óbvia.

Para responder a esta pergunta, vamos analisar os meios que existem para diferenciar uma pessoa da outra. No passado, não havia muito mais do que o nome e a aparência física para distinguir uma pessoa da outra. Mas estes métodos não são bons. Eles podem ser contornados. Um nome pode ser falsificado, enquanto dois irmãos muito parecidos ou gêmeos podem se passar um pelo outro. Em resumo, nomes e aparência não são bons métodos para identificar indivíduos.

Nossa civilização atual criou documentos com números, fotos e códigos para diferenciar e identificar cada pessoa. Assim, em tese, cada um tem o seu RG ou CPF (entre outros, de acordo com o país). Mas eles também podem ser falsificados com extrema facilidade. Além disso, não servem para constatar a individualidade do ser humano em formação no útero porque não se fornecem documentos para embriões/fetos. A própria certidão de nascimento contém em si a ideia de que a pessoa só passa a existir depois que sai da barriga materna, o que é questionável, afinal ela já era humana desde muito antes do parto.

Existe a impressão digital. Ela é amplamente utilizada para identificar um indivíduo, afinal não existem duas digitais que sejam idênticas, mesmo entre gêmeos “idênticos” (que surgiram do mesmo óvulo materno fecundado). Será que a impressão digital ajudaria a demonstrar que o embrião é um indivíduo distinto da mulher que o carrega no útero?… A resposta é não. O embrião ainda não tem dedos formados e, portanto, ainda não possui digitais.

Se pensarmos em termos moleculares, vamos chegar à carga genética do indivíduo e descobrir que esta é única para cada um de nós. Tanto é verdade que os testes de paternidade são baseados em exames de DNA. Aliás, é a distinção genética que determina que fulano, e não cicrano, é o pai da criança. Nossas leis já reconhecem isso. Nossas leis sabem que a individualidade civil e criminal é decorrente da individualidade genética. Logo, o que diferencia uma pessoa da outra, em última análise, é a sua carga genética. Se assim não fosse, o famoso exame de DNA não teria o menor valor perante um juiz.

E os gêmeos “idênticos”? Se uma mulher estiver em dúvida quanto a paternidade de seu filho porque os dois supostos pais forem gêmeos idênticos, como a questão é resolvida? Eles são geneticamente o mesmo indivíduo? Se forem, o argumento da individualidade genética não é válido.

Quem forneceu bases científicas concretas para responder esta pergunta foi o professor britânico Sir Alec Jeffreys, em 1984. Ele descobriu o que podemos chamar de “impressão digital” genética. Em 1992, Jeffreys identificou a ossada do nazista Josef Mengele, morto em 1979, comparando o DNA obtido de seus ossos com o DNA de sua viúva e filho.

Uma das coisas que o professor Jeffreys fez foi descobrir como usar os minisatélites de DNA, que são regiões com repetições em cadeia, na ciência forense, ajudando a identificar pessoas através dessas regiões. Essas regiões de DNA são diferentes mesmo entre irmãos gêmeos.

Então, voltamos para os gêmeos idênticos. Até pouco tempo atrás se acreditava que os gêmeos idênticos teriam exatamente a mesma carga genética. Isso tornaria impossível identificar um dos gêmeos apenas por meio de um exame de DNA. Mas estudos recentes e muito interessantes têm demonstrado que gêmeos homozigóticos (que foram originados a partir do mesmo zigoto) são geneticamente distintos. Os geneticistas moleculares Jan Dumanski e Carl Bruder, da Universidade do Alabama, estudaram pares de gêmeos e constataram que todos eles eram distintos de seus irmãos “idênticos”.

O que essas descobertas estão nos mostrando é que é possível determinar a individualidade do “ser” por meio do estudo da sua “impressão digital” genética única. Em outras palavras, não existem dois seres humanos geneticamente idênticos, mesmo se forem gêmeos univitelinos. Portanto, se nossas leis já usam metodologias de determinação genética para apontar um indivíduo e selecioná-lo dentre todos os outros na sociedade, será que podemos fazer o mesmo com o embrião/feto?

Para responder, precisamos saber se o embrião/feto já tem uma carga genética distinta ou se sua carga genética única é adquirida apenas depois que ele deixa o útero materno.

Em que momento, então, o embrião passa a ter uma carga genética única, que o diferencia de todos os outros seres humanos?

A resposta é conhecida há muito.

Quando o espermatozoide (masculino) encontra o óvulo (feminino), ele penetra no citoplasma desencadeando uma reação que impede que outros espermatozoides entrem. Este impedimento garante o número correto de cromossomos para a formação de um novo ser humano. É importante lembrar que tanto o espermatozoide quanto o óvulo, também conhecido como oócito, são haploides, ou seja, contêm apenas metade dos cromossomos das células diploides (células somáticas). Mais precisamente, eles contêm apenas uma cópia de cada cromossomo, lembrando que temos duas cópias de cada cromossomo em nossas células.

Sabendo disso, fica óbvio entender que células sexuais (espermatozoides e óvulos), não são seres humanos. A morte de milhares de espermatozoides ou a perda mensal de óvulos não fertilizados não pode, em hipótese alguma, servir de base para justificar o aborto. Algumas pessoas menos avisadas (leia-se, sem conhecimentos básicos de biologia), usam o raquítico argumento de que células sexuais são perdidas e mortas o tempo todo para tentar minimizar o ato cruel do aborto provocado. Um pouco de conhecimento mostra que esse argumento não tem sustentação. No fundo, o argumento é apenas mais uma tentativa de reduzir o ser humano à condição de punhado de células descartáveis.

Então, o encontro do oócito (haploide) com o espermatozoide (haploide) vai dar origem a uma célula diploide. Mas em que momento isso acontece? Quando o material genético do pai se funde ao da mãe?

Depois da entrada do espermatozoide, o oócito completa uma segunda divisão meiótica. Ele tem um pró-núcleo. O espermatozoide também forma um pró-núcleo dentro do óvulo fertilizado. As membranas de ambos os pró-núcleos se dissolvem, deixando os cromossomos livres dentro da célula originalmente feminina. Ela está pronta para sofrer uma mitose, uma divisão celular contendo todo o material genético de um novo ser humano. Para que isto aconteça, é formado o famoso fuso mitótico entre os cromossomos herdados do pai e os da mãe. Este fenômeno reúne material genético de dois seres humanos distintos, originando uma célula com carga genética diferente da que possuem os progenitores. Esta nova célula distinta é chamada de zigoto. Sua formação acontece no primeiro dia de fecundação.

Zigoto

Zigoto contendo material genético herdado do pai e da mãe.

Ao final do processo de divisão celular, podem ser observadas duas células contendo 46 cromossomos cada, exatamente o número de cromossomos das células de um adulto.

O zigoto vai dar origem ao embrião por meio de mais divisões celulares. O embrião ao feto, e o feto à vida extrauterina. O mais importante, entretanto, é saber que nós já somos geneticamente distintos, individuais, desde a formação do zigoto, no primeiro dia de fecundação. Nosso raciocínio, agora, ganha mais embasamento.

Considerando que nossas leis são hábeis em identificar uma pessoa entre todas as outras por meio de um exame de DNA;

Considerando que os seres humanos se distinguem geneticamente uns dos outros desde a formação do zigoto;

E, considerando que é possível identificar por meio de testes laboratoriais que o zigoto, o embrião e o feto são seres humanos distintos (possuem toda a carga genética humana):

Cai por terra o argumento de que o aborto provocado é um direito da mulher porque ela pode decidir tudo o que quer fazer com o próprio corpo. O corpo dela é distinto geneticamente ao do novo ser humano em formação, desde a origem do zigoto. O corpo em formação não é mais dela. O corpo em formação não é mais do pai. O ser humano em processo de formação é um novo indivíduo, distinto de todos os outros.

De novo, já que usamos a identificação genética para determinar o indivíduo em casos de paternidade e na medicina forense, este mesmo conceito pode e deve ser usado para determinar que o embrião, o feto e mesmo o zigoto são individualidades humanas em processo de desenvolvimento. Da mesma forma que uma criança de sete anos de idade também está em desenvolvimento. Da mesma forma que uma menina de quinze anos de idade está em desenvolvimento.

Por todas essas razões, a vida humana deve ser amparada e protegida em todas as suas fases de desenvolvimento. A Ciência dá a base para esta consequência. Somos indivíduos únicos desde a concepção.


Os artigos referenciados abaixo tratam das diferenças genéticas entre gêmeos.

  • Phenotypically Concordant and Discordant Monozygotic Twins Display Different DNA Copy-Number-Variation Profiles.  Bruder C.E.G., Piotrowski., Gijsbers A.A.C.J. et al. Am J Hum Genet. 2008 March 3; 82(3): 763-771.
  • Neonatal DNA methylation profile in human twins is specified by a complex interplay between intrauterine environmental and genetic factors, subject to tissue-specific influence. Gordon L, Joo JE and Powell JE et al. Genome Res. 2012 Aug;22(8):1395-406.